Há quase um mês, JPrettin e eu compusemos o coco “Vou consagrar meu ori”, na beira do mar em Piedade, próximo a Prazeres, Jaboatão dos Guararapes. O título é parte do refrão não apenas de autoria de JPrettin na letra do coco, como foi corporalmente expressado por elu quando chegamos ao mar.
Se pensarmos literalmente, o mar não estava calmo neste dia, ao contrário do que diz a composição. Quando a finalizamos, percebemos, ao longe, a chuva vindo com rajadas de vento que arrancavam os guarda-sóis da areia da praia, em meio a comentários cômicos de JPrettin, com a sua usual energia virginiana. Signo que costuma me mostrar uma percepção não apenas irônica, por vezes, mas mais detalhada e crítica sobre os acontecimentos. Diferente da minha usual desatenção.
Quando a ventania chegou em nossa área, junto com a chuva, de repente, um guarda-sol enorme que protegia a mesa, ao nosso lado, foi arrancado pela força do vento, vindo com extrema rapidez em direção ao meu rosto. Só tive tempo para protegê-lo erguendo o braço direito, similar ao gesto de proteção no jogo de capoeira, em que braços e mãos são os melhores escudos de um possível golpe do adversário.
O guarda-sol desgovernado bateu no nosso com tanta rapidez que nem percebi a cena se concluir, em cima de mim. O guarda-sol da nossa mesa acabou impedindo o impacto sobre meu rosto, sendo arrancado violentamente pelo o do vizinho. Ambos saíram bolando praia a fora.
Ficamos paralisados ou impactados, mas rindo com a cena inesperada. Alguém perguntou se tinha batido em mim. Respondi que não. Em seguida, JPrettin me chamou a atenção do que entendi como “livramento”.
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Antes da pandemia, morando na Encruzilhada, tinha mandado mensagem para Mestra Joana, pois tinha decidido conhecê-la e frequentar o Baque Mulher e o Maracatu Nação Encanto do Pina, apesar da distância. Precisava de referências e acolhidas femininas que me mantivessem forte.
Falei com a Mestra pelo WhatsApp, que foi convidativa, mas acabei não indo.
Três anos se passaram.
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Na semana passada finalmente fui à comunidade do Bode, falei rapidamente com Mestra Joana e ainda pude ensaiar com o Baque Mulher e o Maracatu Nação Encanto do Pina.
Fui e voltei de bike: de Linha do Tiro para a Comunidade do Bode. Da praia do Pina para Linha do Tiro. Três quilômetros a mais, em relação à Encruzilhada. Para além do perigo do trânsito e segurança desta rota que é iminente. Contudo, o que me move são as proximidades simbólicas.
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JPrettin elogiou a parte da minha contribuição para a composição do coco, no qual se diz: “Meu amor vem chegando / Chegando de mansinho”.
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Cheguei no horário da tarde na comunidade do Bode e só saí quando encerraram os ensaios. Eu não uso relógio e estou sem celular. Resolvi ir à praia. Não saber as horas me dá mais liberdade de escolha. A lua, em meio a nuvens, estava bonita. Terminei a sequência de alongamento. O mar me chamava. Atendi-o. Coloquei os pés n’água, cantei os versos de JPrettin, repetindo os mesmos gestos recitados: limpei meus pés, minha boca e meus ouvidos. Olhei para o horizonte do mar que me atraía como um ímã. Porém, outra força me puxava, me avisando que deveria voltar.
Quinze minutos depois de ter saído do Pina, numa parada não planejada, novos livramentos simbólicos foram percebidos, logo concretizados. “Ah, então era isso que a minha intuição queria me mostrar. Mais uma confirmação…”.
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O meu mar está calminho como o da composição: “Como a onda quebra o mar / Quebra devagarinho”. O amor acontece assim, sem pressa, quando a gente menos espera.
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